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Sebastião Rodrigues

Sebastião Rodrigues

Sebastião Rodrigues (1929-1997) dedicou a vida ao mundo das artes visuais e da cultura. Desde muito cedo teve contacto com os processos e meios de produção gráfica, que lhe proporcionaram exímias capacidades técnicas. Estas, aliadas à sua curiosidade e capacidade criativa, fizeram de Sebastião Rodrigues um dos grandes nomes do design português do Séc. XX.

Homem tímido e introspectivo, de talento e rigor insuperáveis, era meticuloso e atento. Fascinado pela etnografia e antropologia, estudou e reuniu muita informação que interiorizava, processava e fazia reflectir no seu trabalho. Apesar da minúcia e atenção a cada projecto, teve uma extensa e profícua actividade. Podia de forma desesperante, condicionar um trabalho por dedicar todo o tempo disponível a resolver um mais pequeno detalhe, que considerava fundamental para o conjunto do projecto. Ainda hoje a obra dele é, e deve ser, inspiradora para qualquer designer.

Criou capas de livros, logótipos, brochuras, estudos para marcas, cartazes, montras, entre muitos outros projectos. Foi sócio fundador da Associação Portuguesa de Designers. Participou em revistas, jornais, organizou exposições, entre outras actividades. São muitos os trabalhos que os portugueses se habituaram a ver durante os anos 70/80 do séc. XX. Quem não conheçe o “Livro de Cozinha Tradicional Portuguesa” de Maria de Lourdes Modesto por exemplo?


Vários livros

Numa altura em que o conceito de "designer" não existia em Portugal (quanto muito a designação seria “artista gráfico”), foi com uns meros 14 anos, no meio de uma guerra mundial e regime dictatorial, que começou a conviver com o meio da comunicação e do grafismo. Começou a executar pequenos trabalhos gráficos no jornal “A Voz”. Essa experiência deu-lhe os contactos que permitiram aceder à agência de publicidade (APA - agência de publicidade artística) em 1946. Começava assim o seu percurso profissional. Durante a sua vida profissional, conheceu e trabalhou com diversos nomes de referência da cultura e das artes gráficas. Antes de haver computadores e “Desktop Publishing” o conhecimento e domínio das artes gráficas eram factor decisivo para a qualidade de trabalho que produzia. Sebastião Rodrigues conheceu mestres gráficos que o marcaram, com os quais trabalhou em proximidade e que permitiram levar as suas criações a níveis de qualidade e excelência.


Posters para o Mosteiro da Batalha

Sebastião Rodrigues odiava viajar. Era no seu trabalho, a viajar no interior da sua mente, rodeado de uma parafernália de estímulos visuais que colecionava, que se sentia realizado. No entanto, foi através de viagens por razões pessoais ou profissionais que reuniu um precioso acervo de influências. Sebastião Rodrigues era um investigador incessante das tradições culturais de Portugal. Reuniu inúmeros objectos inspiradores de raíz etnográfica; Elementos símbólicos, icónicos, formas, registos gráficos que angariou pelo pais fora. Os seus locais de eleição eram o museu de Arte Popular e o museu etnográfico Leite de Vasconcellos, autor cujas obras lia avidamente. Imerso em livros, revistas de artes gráficas e de composição tipográfica foi através da análise exaustiva, reconstrução e inspiração destas referências que elaborou a grande parte, senão a maioria do seu trabalho. Desenhava um pouco de tudo, fosse com pincel e guache ou com lápis, em materiais básicos como papel vegetal e papel cenário; símbolos, tipografia e demais elementos sempre baseados em formas tradicionais, arquitectónicas, objectos típicos, inscrições e quaisquer outros elementos de raiz portuguesa. Guardava todos os pequenos esboços e rabiscos que fazia. Eram o seu acervo criativo, que a determinada altura podia usar para resolver um bloqueio criativo em qualquer um dos inúmeros projectos em que participou.

Numa altura em que a norma era juntar imagens e texto disponível, foi pioneiro na tipografia inovadora apesar de nunca ter desenhado uma fonte completa. Percebeu que adequando a tipografia ao tema do projecto obtinha resultados bastante melhores. Através do desenho ou redesenho de fontes, adaptava os títulos e outros textos para serem parte integrante da composição gráfica. Usava uma abordagem semântica na aplicação do texto, atribuindo-lhe carácter e adequação à mensagem que a imagem veiculava, reforçando-a.

O Papel Moeda em Portugal

Sebastão Rodrigues era um perfeccionista atento ao mais ínfimo detalhe, desde os esboços até à produção das peças. Trabalhou intimamente com mestres tipógrafos (nomeadamente João Gonçalves, mestre impressor) que lhe permitiram, juntamente com o conhecimento profundo dos processos de produção gráfica, preparar e produzir obras sem paralelo. Passava horas na gráfica, retocava e montava ali mesmo soluções para problemas que surgissem, ou para melhorar um processo. Um exemplo sublime é o da primeira tentaiva de re-edição do livro “Papel-Moeda em Portugal”, para o Banco de Portugal. O objectivo do livro era elaborar um catálogo das notas do banco de Portugal ao longo da história. Teria que ser minucioso e criteriosamente executado, pois era facilmente comparado aos originais - bastava abrir a carteira.

Símbolo de Sebastião Rodrigues

Para o projecto, foi fundamental a colaboração do mestre João Gonçalves, que conhecia todos os “truques” do ofício. João Gonçalves dominava um recente processo - revelação das selecções de cor das novas películas de off-set. Com a experiente equipa da gráfica e no pico do seu percurso profissional, Sebastião Rodrigues trazia as provas para o atelier, retocava, compunha por cima, apurava soluções mais elaboradas e à medida. Voltavam a testar nas máquinas, imprimiam cores especiais, trocavam cores e faziam outros ajustes inovadores, até obter o efeito desejado - a perfeição. Quando se tentou fazer a re-edição, e pela análise do livro original, chegou-se à conclusão que tal não era possível, pois a obra era constituída por “cadernos” - conjuntos de páginas comuns no mesmo plano de impressão - elaborados meticulosamente ao longo de meses e cujo processo de produção não era possível descortinar. Alguns deles impressos, pasme-se, com 16 cores directas e com seleções de cor e ajustes feitos à medida, manipulados na elaboração das chapas e no processo impressão. Apesar disso, mais tarde, em 1997 foi realizada uma nova edição.

Alguns trabalhos (resumido):

  • Cartazes, folhetos e catálogos para a Fundação Calouste Gulbenkian - O Papel-Moeda em Portugal para o banco de Portugal
  • Cartazes Museu Mosteiro da Batalha
  • Capas livros (várias editoras e períodos) - José Cardoso Pires, Roger Vaillant, Raymond Queneau, Italo Calvino, Mircea Eliade, Romeu Correia, Castro Soromenho, Maria Judite de Carvalho, Jack Kerouac, William Faulkner, Marguerite Duras, Voltaire, A.H.Oliveira Marques, entre outros.
  • Catálogos, cartazes, folhetos, brochuras para os mais diversos clientes


Bibliografia/referências:


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